O MUNDO POVOADO APENAS POR:
ZÉS BELEZA!
Em 06 de Abril de 1973, Prata de Melo escrevia no Jornal Notícias de
Penafiel “Como seria bom o mundo, se o povoassem apenas Zés Beleza!”
Em 2007 desconhecendo este achado que hoje anexamos, fomos capazes realmente
de reproduzir esta cópia fiel e muito bem esclarecedora do pouco que conhecemos
do Zé, com uma longa metragem intitulada, RAIA PICOTA - vidas cruzadas.
E Prata de Melo, tinha escrito em 1973…
Novelas 10 de Fevereiro de 2012;
In Raia Picota Vidas Cruzadas
O Zé Beleza.
«Chamavam-lhe Zé Beleza, porque nunca se lembraram de chamar-lhe, por
exemplo Zé Bogalho, porque ninguém chama Maria Cebola ou outra coisa qualquer à
senhora Maria Beleza. Ou então porque não existe uma palavra chamada
hereditariedade.
É isso uma alcunha hereditária.
E não lhe acenta mal o apodo, que o diga quem conhece a sua forma de
viver…. é o que se chama uma vida em beleza.
Saúde, dinheiro e amor!
Sim o Zé Beleza é sadio, calça os pés nos sapatos da nudez, de solas rijas
de pele humana, meias de poeira e demais detritos do caminho sujo, e vá a neve
ou chuva pregar-lhe uma partida de constipação!
Os Xaropes nicotina-bagaço anularão qualquer tentativa dessas.
Dinheiro tem-no, produto do seu trabalho quando lhe dá para trabalhar,
trabalho no amanho do solo que dá pão e flores, na transformação em cavacos dum
tronco de árvore derrubado para o braseiro de Inverno.
Trabalho explorado por eventuais patrões.
Dinheiro de esmolas hipócritas na maioria, mas que o Zé Beleza aceita, já
que no dizer dele, medalhas destas aceitam-se sempre.
Amor, sim, o Zé Beleza também ama. Eu conheço-lhe o amor. A paz, abomina e
evita o conflito.
Como seria bom para o mundo, se o povoassem apenas Zés Beleza.!
Vive sem complexos da sociedade, sem protocolos, sem hipocrisia, sem
qualquer problema.
É Livre!
Atrevo-me a chamar-lhe hipphie, e não menosprezarei os princípios
verdadeiros, que não os usarão mais que o Zé Beleza.
Há quem o condene, quem ria com a cena triste do filho que lhe arremessam
pedras, ou que insultam no caminho pacato que o leva.
Acaso esses viverão a vida!
Será realmente vida este período de transformação na terra, entre o
nascimento e a morte, passado na confusão quotidiana, na poluição conjunta de
almas e ambiente, na máscara da civilização e com traição, ódio especulação,
hipocrisia, crime?
Ou será que a vida é o ar que o Zé Beleza respira!
Ele, não atraiçoa pinheiros que lhe dão a sombra amiga. Tem o sol que o
aquece sem esperar recompensa, e as estrelas que lhe velam o sono nas noites em
que as toma para tecto.
Tem a brisa que não lhe nega ao aromático o silvestre e a felicidade não o
abandona, a sua felicidade.
Porque o Zé Beleza é feliz… à sua maneira é feliz… e morrerá como os
outros, como aqueles que têm tudo, tudo menos a saúde a liberdade e a
felicidade do Zé Beleza.
E talvez a terra lhe pese menos, porque ele não terá o luxo do granito, ou
do mármore a cobri-lhe a tumba, nem a cruz de ferro lúgubre a endireitar-lhe o
leito da paz, nem epitáfio inútil de saudade. E de que lhe serviria ao fim e ao
cabo?!
Quantos te invejarão Zé Beleza, na cobardia de te condenarem?»
In Jornal de Notícias de Penafiel - PRATA DE MELO - 06 de Abril de
1973
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